M. Romão e seu filho Jorge Samora na festa de lançamento da Rádio Mamaterra no Quilombo do Sacopã um dia depois do 13 de maio de 2011.
Amigas e amigos do Rio e do mundo.
Posso parecer chato, quando temos tantos casos, de discriminações em bancos e supermercados, brigas por cotas e bate-bocas no big-brother além de crises com artistas na globo.
Afinal são temas que a mídia dá certa atenção, pois descobrem aos poucos que também tem negro classe média com poder de compra, nem que seja no borrachudo.
No Quilombo do Sacopã está acontecendo um caso paradigmático para os negros no Brasil, que vivem na beira da bolsa-familia e em busca da sobrevivência mínima. Eles estão ameaçados.
Uma sentença de 94, resultado de um processo de 89, que não permitia aos então, às familias dos “posseiros há 122 anos” dos 23 alqueires no meio do paraíso dos cariocas abastados, venderem ou comercializarem qualquer coisa em suas moradas.
Esta duvidosa sentença de 94, que proibia qualquer uso çomercial do local, foi utilizada para justificar um novo ato judicial que põe em dúvidas a isenção e respeito à isonomia da justiça para com todos cidadãos, ao ser ordenado sumariamente, sem ouvir as partes, o lacramento do portal de entrada para as residências de 7 famílias quilombolas (32 pessoas ao todo). O que caracteriza cárcere privado para as pessoas que não podem se locomover sem o auxílio de um carro.
Isto aconteceu, depois que ainda no governo de Benedita da Silva, eles foram reconhecidos como Quilombolas, lhes dando proteção estadual e pelo INCRA na área federal.
Sei que muitos poderão dizer que os cidadãos e cidadãs nascidos e criados e que vivem no Quilombo do Sacopã, destoam com suas festas e cultos, da harmonia local. Sei também que muitos poderão dizer que lá não se produz cultura e sim “comércio”.
Quantos condomínios no Rio de Janeiro não alugam vagas para terceiros em seus estacionamentos e seus salões de festas para pessoas de fora? Alguém já ouviu falar da “justiça” fechar um condomínio por estes motivos? E as lojinhas, bares, farmácias e boates debaixo dos prédios?
Dois pesos e duas medidas é o que acontece.
E o que é cultural para um quilombola?
A primeira coisa que um quilombola precisa fazer para manter sua cultura é se manter vivo, alimentar-se para sobreviver.
A ordem judicial da juíza da 8a Vara Civil do Rio de Janeiro, foi o primeiro passo para o estrangulamento da comunidade do Sacopã.
Muitos também poderão dizer que faltam projetos culturais no Quilombo do Sacopã. Mas o que foi feito pelos governos federal, estadual e municipal para melhora do local onde os quilombolas vivem e fazem seus negócios, entre os quais a produção de cultura?
No dia 24 de junho de 2011, em Caraíva-BA, um líder quilombola foi morto por policiais em sua própria casa diante da família e depois teve o corpo levado até uma boca-de-fumo em um outro município, onde após uma suposta troca de tiros entre a polícia e um cadáver, foi levado para um hospital para constatarem a morte.
Qual foi o suposto crime dele? Era carvoeiro e a empresa plantadora de eucaliptos, suspeitava que ele roubava madeira nas terras que foram tomadas de sua comunidade ancestral.
Muito vão dizer que eles não produziam cultura, não eram quilombolas. Não mereciam a solidariedade do movimento negro.
Em muitos quilombos do Brasil, a única ajuda que recebem é a cruz dos missionários e uma merreca em alimentos. Param de dançar jongo e realizarem outras manifestações não cristãs e falecem de suas culturas. Mais uma vez está justificada a inação do movimento negro, da sociedade, do estado brasileiro.
Os novos “antronegropólogos” que adoram estátuas e culturas empalhadas, podem descansar. Quilombola vivo, nem pensar. Eles suam e não são profissionais em lidar com o poder branco. São objetos em extinção mesmo…
Mas feito os quilombolas não escrevo aqui para chororô. Há muito o que fazer. O Rio tem o privilégio de ter negros no governo municipal e estadual, além de contarem com o apoio do governo federal.
Está na hora de fazer uma ação (projeto não) de resgate econômico desta comunidade. Os quilombolas do Sacopã tem orgulho suficiente para olharem de igual para igual seus vizinhos abastados, mas sem dinheiro no bolso, um dia a casa cai.
Mas não só nossos negros e negras nos governos tem que fazer alguma coisa. Todos nós que queremos os quilombolas vivos, temos que transformar nossa solidariedade em ação. O que fazer? Perguntem, conversem com eles, eles sabem as soluções para os seus problemas, só falta incentivo financeiro que lhes garantam a sustentabilidade.
Marcos Romão